BANQUETE DE MINHOCA

Eu sou uma minhoca, uma minhoca de praia, que não é nem bem uma minhoca, mas o ser humano é ignoratnte, chama todo o bicho comprido de minhoca ou lombriga. Quando amanhece o dia, eu falo: "Ai meu Deus, outro dia", geralmente todo mundo agradece, eu não. Tenho que escapar das pombas que coitadas, são mais infelizes do eu. O ser humano mija na água, faz cocô e a culpa das doenças é delas, isso quando não trempam lá, é o que eu vejo muito à noite. Essas minhocas da noite são bem grandes, eu chego a ficar com complexo de inferioridade, mas interessante que essas grossas e grandes elas não tentam bater, nem pegar pau de barraca pra exterminar a coitada, ela apenas gritam "ai, ai, ai", então elas estão sendo mordidas e não fazem nada, só gemem, e comigo que nem mordo, e se mordesse, não doiria tanto, e fosse comparar a minha boca com a do minhocão, a minha boquinha nem aparece e a do minhocão ainda vomita em cima delas, ai que nojo! Elas chutam, gritam, pegam sandália, jogam coisas pesadas em cima de mim pra me exterminar e comparada com as da noite, eu sou minúscula e minha mordidinha nem vai fazê-las gemer tanto de dor, pois é, por que elas querem tanto me assassinar? Eu só quero ter o direito de viver, igual a elas. Ainda bem que esse minhocão não tem de dia, só à noite, porque já pensou se um deles me pega quando eu tiver dormindo? Eu vou ser chupada que nem macarrão. Sabe, a minhoca sofre. Eu tenho pena também das pombinhas. Eu vejo eles jogarem areia nelas, coitadas, mas elas têm asas e podem chegar bem pertinho de Deus, no céu, coisa que o ser humano arrogante não pode, é como a mim, se arrastam no chão e ainda tem uns que me pegam pra ser isca de peixe e ser comida deles, mas eu tenho meu dia de glória: é quando eles morrem e eu tenho um banquete, eu e os outros vermes, comendo o verme maior, o único que tem língua que calunía os outros e fazem maldade sem motivo, aí eu como, como, como; desse eu escapei de ser esmagado, esse já está na minha barriguinha, agora vou dormir e me preparar pra outro dia difícil, e segue a vida.

Kátia Paes