PARA QUEM ME INVEJA


Não sabe o que eu sofri; não sabe quantas noites eu fiquei sem dormir pensando por que eu havia nascido; não sabe quantas surras eu levei de chibata ou de duas correias dobradas, sem merecer, na maior parte das vezes eu não merecia, e aí, quando perguntavam no colégio: "Por que a Kátia não está vindo?", quando ligavam para casa, aí a minha mãe dizia que eu havia caído e me machucado muito, estava de cama e quando queriam me visitar ela dizia que eu estava toda inchada, coitada.  Até que um dia, um anjo chamado Eidi de Souza, professora de História que eu tenho como uma mãe verdadeira e é tão bonita as nossas cores. Ela era negro como ébano e eu, loira como trigo, mas olha, o nosso doce coração era vermelho paixão, de filha e mãe.

Às vezes, não poucas, depois de eu apanhar, ela me botava no banho de água quente. Ai como dói! Só quem apanhou desse jeito sabe o quanto dói, quanto dilacera não só o físico, mas a alma. Quem me inveja, inveja o que vê externamente, não a Kátia interna, as minhas mágoas, os meus rancores, as minhas más lembranças. Por 10 anos eu desejei uma bicicleta. O meu irmão desejou uma só vez que ganhou. Eu era tão burra, porque mamãe dizia que o Papai Noel havia deixado por engano em outra casa e eu acreditava, igual quando vinha visita das amigas dela e ela me dizia para eu ver se ela estava na esquina, só pra dizer que eu fazia tudo o que ela queria, e eu ia lá na esquina, até que uma vez o carro me pegou, a sorte que era o carro do meu pai que estava para entrar na garagem, mas mesmo assim eu fiquei com a perna toda roxa. Idade minha: 4 anos, então ela parou de fazer isso. 

Conto as vezes que minha mãe me beijou. Tudo de melhor era do meu irmão, os maiores e mais moles bifes eram dele, me casou contra a minha vontade com um rapaz que eu não gostava e até hoje não gosto, tudo por uma pensão, porque se eu fosse filha solteira, ela seria minha. Aos 4 anos e meio, no final da gravidez dela do meu irmão, ela teve catapora, aí eu fui mandada para a casa da minha Tia Otília. Foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida. Perguntavam por que eu estava lá na casa da minha tia, aí eu respondia que porque minha mãe havia morrido e meu pai tinha se casado de novo e eu detestava a minha madrasta. Minha mãe vivia dizendo que eu havia sido trocada na maternidade, porque eu era loira verdadeira e detalhe, meu pai era, só que com a brilhantina, o cabelo escureceu. Detalhe: no dia que eu nasci, eu era a única criança que nasceu naquele hospital. A minha avó paterna era loira de olho azul. Eles eram europeus.  

Então você que me inveja tanto, não me inveje, você não sabe o que é nascer um anjo e depois se transformar em um demônio devido aos maus tratos, mas você que me inveja, já nasceu um demônio.


Kátia Paes 

Comentários

  1. Sou o Áli, fiquei muito entristecido ao ler esta matéria, e saber um pouco do que você passou, infelizmente várias crianças passam por maus tratos, e na maioria das vezes pelos próprios pais, por outro lado apesar de te conhecer a pouco tempo fico feliz em você não ter se deixado abater, e tenha se tornado essa pessoa do Bem que você é Que Deus te Abençoe sempre!!!!

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    1. Você é uma pessoa do bem Ali, você captou o que eu quis dizer, porque a pessoa inveja o que a outra tem, mas não sabe o que ela passou e que está passando porque eu luto contra o irmão ladrão e não vejo outro qualificativo porque ele me roubou tudo e estou há dois anos aqui, então acabou o casamento, aliás, o casamento eu não posso reclamar porque minha mãe, como ganhava muito, não ia ter direito à pensão do magistrado, pois se eu fosse solteira, seria minha, então ela me arrumou um casamento e me entregou, isso um dia eu conto melhor. Você tem uma grande amiga e espero que seja recíproco. Obrigada, Kátia.

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