BENÇÃO DE DEUS




Em 1962 eu tinha 5 anos. Ia fazer ainda porque sou do meio do ano. A gente morava no prédio da Barata Ribeiro, perto da Constante Ramos e a Barão de Ipanema. Me lembro até hoje. Eu apanhava tanto, sangrava tanto, porque minha mãe batia com a fivela do cinto, e eu cantava, porque diminuía a dor, aquela música “Quando Eu Morrer, Não Quero Choro Nem Vela, Quero Uma Fita Amarela Gravada Com o Nome Dela”. Minha mãe ria enquanto continuava a me bater e dizia: “Ainda por cima é burra, não sabe que tem que ser o ‘nome dele’, porque tu és mulher!”. “Não mamãe, você que não sabe, porque quando a gente morre não é mais nada”. Eu tinha 5 anos. 

Às vezes eu me perguntava: “Por que você me bate tanto?”. “Porque eu sou tua mãe”, ela me dizia. “Tu és mulher, vais ter que te acostumar a sofrer”, disse ela. Então lhe respondi: “Você é mulher e não sofre”; “Porque eu não fui burra como tu és”. Então eu ia para minha cama enquanto ela cantava para meu irmão, e eu cantava para mim mesma dormir “Suave É A Noite”, cantada por Moacyr Franco. Sabe, tem pessoas que vêm ao mundo só sofrer, como eu, mas não se sinta vítima, nem infeliz por isso, porque ninguém conhece a infelicidade e o sofrimento como gente, assim como a felicidade, pois foram tão poucos os momentos, que ao relembrá-los, vemos o quanto somos fortes, porque apesar de tantos sofrimentos, se você está lendo agora o que escrevi, agradeça a Deus pelo ar que você ainda respira e por você não estar ainda debaixo da terra.

Não percam a fé em Deus nunca! Ele sempre tem um propósito para a gente. Eu nunca critiquei, nunca perdi a fé, mesmo aos 5 anos.  Eu dizia "Eu O sinto, sei que Ele está perto de mim me protegendo", tanto que apesar das cintadas, dos chutes quando eu caía no chão, com escova, não estou aleijada e continuo viva. Detalhe, eu sou cardíaca de nascença, puxei meu Avô Grande, mas ela nunca levou isso em conta e com tudo de mal que ela fez a mim, ainda tenho saudades dela, porque se uma mãe faz isso contigo, não sinta raiva, ela está te preparando pra vida.


Kátia Paes


PS: O que mais doía é que ninguém fazia nada. Só três pessoas que não moravam em casa, que foram o meu Avô Grande, minha Avó Anita e a Tia Olívia. Saudades.

 

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