MINHA INFÂNCIA


Recordar, quando é coisa boa, é ser feliz duas vezes, mas no meu caso é sofrimento. Eu sofro várias vezes, então eu tive que me preparar em etapas para contar a minha história. A menina que nasceu no berço rico e que tinha que beijar o pé da empregada para comer, o nome dela era Raimunda. Eu não vou mudar o nome porque verdade tem peso. Eu apanhava dela aos 4 ou 5 anos quando eu morava em Manaus, e pesava pouco mais de 8 Kg. Eu só comia feijão com arroz porque ela fazia de propósito ao matar a galinha, não cortar o pescoço todo, só para ela ficar pulando com dor. Depois que a galinha morria, ela a fervia, depenava, jogava álcool e então um fósforo. Era um bangalô na Av. Joaquim Nabuco. 

Se você perguntar como foi a minha infância eu diria que foi terrível. A primeira relação sexual que eu vi entre um homem e uma mulher foi entre um cabo militar e a Raimunda. Eu desci as escadas, porque estava com fome, e ao entrar na cozinha os vi transando em cima da mesa. Ela se levantou e olhou pra mim, mandou ele me mostrar o pênis negro e se eu contasse pra minha mãe, eu seria a próxima a ter o pênis dentro de mim. Não sei se ela está viva, mas é uma pessoa que eu quero que esteja no inferno. Ela viva dizendo que matava meus patinhos, meus papagaios, bicho preguiça, só de maldade. Por que? Ela dizia: "Loira! Eu odeio loira", porque ela era negra, mas as minhas maiores amigas eram negras graças a Deus! Porque até hoje eu gosto delas. - Beijo pra Custódia do Babilônia, pra Rosemary do Chapéu-Mangueira, beijão! Saudades! - Bom, voltemos à Manaus. Eu vivia caindo porque tinha no caminho da cozinha pro quintal uma escada, então ela vivia me empurrando e dizendo à minha que eu mãe que eu era tão magra e tão branca que eu deveria ter algum problema de saúde, mas aí um dia a minha avó viu a marca de correia em mim. A mamãe fingia que não via porque detestava ficar sem empregada, afinal era a mulher do presidente do Tribunal de Contas (hoje é conselheiro, mas naquela época era presidente). Meu pai era político e quando ficava com raiva, ele jogava telefone pela escada, pelo quintal e eu tinha que me abaixar porque quase pegou em mim uma vez. Ele era muito amigo do Gilberto Mestrinho. Eu digo o nome de todo mundo aí, não vai ter nome falso, eu posso comprovar, então pronto. 

Aí o papai e a mamãe saíram para trabalhar e fiquei só com a Raimunda. Eu tremia, tinha pavor, e a minha avó esperou mais ou menos uma hora e meia, no horário em que ela devia dar o leite para mim, ficou escondida atrás a porta e viu quando ela cuspiu dentro da xícara com leite para eu tomar. Eu lhe disse que não ia tomar porque ela havia cuspido. Como eu havia visto ela beija o treco daquele homem, eu comecei a ter nojo dela e aí quando ela cuspiu na xícara de leite, eu não quis tomar de jeito nenhum. Ela me puxou pelo cabelo, me deu cintada na bunda - enrolada na toalha para não marcar -, então a minha avó Belmira a pegou em flagra, chamou meu pai que mandou prendê-la. A minha mãe ainda queria desculpá-la dizendo que eu tinha inventado. Minha avó disse que havia visto ela dizer para mim que eu tomasse o leite com cuspe porque um dia eu ia experimentar o picolé preto do cabo. Aí meu pai mandou prendê-la. 

Minha mãe engravidou do meu irmão. No oitavo mês ela teve catapora e graças a Deus eu fui morar com a minha Tiinha - a chamava assim porque ela era magra e a outra, Tião, porque era gordona -  ambas irmãs do papai. Eu dizia que minha mãe era a minha madrasta. Quantas e quantas surras. Se ela fosse pentear o meu cabelo e ele estivesse embaraçado, ela me batia com a escova de cabelos, com o cabide, com o que tivesse... 

...continua amanhã.

Kátia Paes



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